Hoje falando de uma experiência pessoal, mas para dissertar acerca de comportamentos mais abrangentes, e nada de próprio.
Participei hoje numa atividade onde era completamente virgem, entenda-se virgem por não haver nunca experimentado a ação. Pois participei na manifestação convocada pela associação QUE SE LIXE A TROIKA, estive em dúvida se participaria em Coimbra, minha cidade do coração, ou em Lisboa, cidade onde tudo se decide e onde tudo tem outra expressão.
Participei em Coimbra, talvez por economia de dinheiro e de esforço, e não me arrependo. Não me arrependo, porque durante a dita entendi que o que move os manifestantes, mais não é que o seu próprio interesse. Esta constatação deixa-me triste, deixa-me entender a assimetria de posições da maioria dos participantes, apenas unidos na luta contra o governo porque este lhes tira direitos. Gosto das pessoas que participam porque entendem que o caminho do governo é genericamente errado e não porque retira direitos a cada um de per si.
Tenho de admitir, o que faço sem dificuldade por questão ideológica, que os únicos que participam genuinamente são os votantes da CDU e do BE, todos os outros estão porque se sentem pessoalmente prejudicados monetariamente. Quando houver eleições votarão naqueles que nos trouxeram até aqui, o PS ou mesmo o PSD, este ultimo se mudar de liderança, pois acredito que entre as gentes da manifestação haveria votantes no PSD que nos governa, participaram apenas porque se sentem enganados na defesa dos seus interesses.
Depois de participar, sem cantorias, nem grande expressividade, mas com grande convicção de que este governo nos não serve e apenas prejudica, assalta-me a dúvida acerca desta democracia, não da democracia como conceito, mas da nossa ocidental e atual democracia. Na defesa da causa desta ultima, poucos são, os que não pensam apenas nos seus direitos, alargando a democracia ao salvaguardar dos direitos fundamentais dos cidadãos e sendo justos e respeitadores de todas as pessoas e de todas as classes sociais. Esses que apenas pensam em si e nos seus direitos ou quando muito nos direitos da sua classe, não são democratas na verdadeira e original aceção da palavra, pois são corporativistas e até egoístas em alguns casos.
O que está errado no nosso país e mesmo no mundo ocidental, é o modelo governativo e a ideologia que lhe dá fundamento. Temos de lutar pelo interesse comum e pela justa repartição da riqueza e direitos, contra a busca constante do lucro como causa última, única até em muitos casos, subalternizando o trabalho em detrimento da finança e da especulação.
Toda esta dissertação, apenas porque durante a dita manifestação ouvi vários comentários, gritos, slogans e até canções serem entoados apenas para dar corpo a reclamações por perdas pessoais ou corporativas. Esta é uma condição que me deixa triste e pouco convicto que a coisa poderá mudar. Digo-o porque temo que nas próximas eleições, muitos destes manifestantes se esqueçam da razão da coisa e se inclinem a votar em quem lhes prometa a defesa pessoal ou da classe.
Erradas são as políticas que privilegiam a finança e a banca em oposição ao trabalho e à produção de riqueza por capacidade produtiva de bens transacionáveis e de consumo, tornando-nos menos dependentes de filosofias economicistas e de rácios matemáticos que são de todo enganadores da realidade dos povos.
Devíamos manifestar-nos para defender o interesse comum e no combate à política seguida pelo governo e governantes, mesmo os europeus e ocidentais, pois têm deixado que a banca e a alta finança tenham decidido os destinos do mundo e suas populações, escolhendo quem deve enriquecer e empobrecer a cada momento, independentemente de suas capacidades e possibilidades.
Durante a manifestação, debati com um amigo a questão e deixa-me sobejamente preocupado o facto de que ele é contra esta situação, por isso estava presente, mas acha que não há alternativa. Fala-me do produto, da divida, da dependência financeira do exterior e outras razões, de que ouço falar todos dos dias. Entendo-os e até sou tentado em compreender as suas razões, se achar-mos que só por nós não poderemos fazer nada. Imaginemos que Alvaro Cunhal ou Mário Soares, falando só dos mais conhecidos, pois há muitos mais nomes na mesma situação, por certo até tendo sofrido mais ou mesmo morrendo em defesa da causa, faziam o mesmo e não se tinham deixado prender ou não se tinham insurgido sem pensar na sua comodidade. Estaríamos ainda no antes 25 de Abril, o que neste momento, eu até aceitaria melhor que aquilo que temos, pois temos todos os defeitos dessa governação, mas não temos nenhuma das virtudes.
Não auguramos nada de bom deste tipo de governação, apenas o empobrecimento e a dependência do cidadão comum de quem é mais rico e poderoso. Se não se mudar de rumo, de paradigma governativo e ideológico, estaremos condenados aos tempos anteriores à grande depressão e até às ditaduras que grassaram por toda a europa no início do seculo XX.
Assusta-me que a próxima votação apenas faça reflexo dos medos e das situações comodas e nunca da defesa das causas justas ainda que temporariamente provocadoras de algum sofrimento pessoal. Temos o poder do voto. Se estamos mal, porque não experimentamos votar diferente do, que maioritariamente, fizemos?
Terminarei ainda com questões:
QUE MEDO TEREMOS DE VOLTAR, OBJETIVAMENTE, À ESQUERDA ?
PORQUE TEMOS UMA SOCIEDADE ANTICOMUNISTA ?
PORQUE NOS ASSALTAM OS FANTASMAS DAS DITADURAS DE ESQUERDA E NÃO OS DAS DE DIREITA CAPITALISTA ?
PORQUE NÃO VOTAM OS POBRES MACIÇAMENTE NA ESQUERDA ?
PORQUE ACHAM ALGUNS QUE O PS TEM SIDO ESQUERDA ?